22 de ago. de 2019

Nightshade


Nos tempos de poucos bits volta e meia aparecia um jogo criativo, cheio de boas ideias, mas que acabava aquém do seu potencial As razões para isso eram diversas... por vezes as ideias que pareciam tão boas no papel eram prejudicadas pelas limitações tecnológicas da época, outras era a falta de verba, tempo ou demais limitações especialmente típicas dos estúdios menores, e por vezes era tudo isso junto, resultando em um jogo que não era ruim, mas deixava aquela sensação de que deveria ter sido muito melhor. Lançado exclusivamente no ocidente para o NES em 1992, pela australiana Beam Software, "Nightshade" é um caso exemplar desse tipo.

História e Roteiro


O roteiro de "Nightshade' é daqueles que enganam... a primeira vista parece apenas uma típica história de um herói solitário tentando livrar uma metrópole assolada pelo crime de um grande vilão e seu bando de capangas, inspirada nas antigas histórias das pulp magazines. E  é aí que o jogo te surpreende... de fato, "Nightshade' busca inspiração nas aventuras pulp e de super-heróis, mas parodiando-as- e muito bem, diga-se de passagem. O jogo é uma grande homenagem satírica ao gênero, brincando com clichês e repleto de passagens e diálogos engraçados, sem contudo abrir mão da aventura!
Basicamente o caso é o seguinte: Após a morte de seu herói de plantão, Vortex (que carrega uma semelhança surpreendente com o Flash da Liga da Justiça), é assassinado pelo vilanesco Sutekh, a cidade de Metro City mergulha em uma maré de crime e caos.
Não se podia esperar outra coisa de um chefe criminoso que anda por aí fantasiado como o antigo deus egípcio Anúbis, não é?
Das sombras de Metro City surge sua única esperança de salvação: o novato pouco conhecido Nightshade (cujo visual por sua vez lembra bastante o de heróis como O Sombra, The Spirit e mesmo o Questão da DC Comics), decidido a derrotar Sutekh, vingar a morte de seu ídolo Vortex e tornar-se o herói que essa cidade precisa (não necessariamente nessa ordem).
E também enfrentar aquele que talvez seja seu maior desafio... ter a paciência necessária para aturar seu nome ser trocado toda hora tanto pelos vilões quanto pelos cidadãos de Metro City.. Nightlamp... Lampshade... cada um chama o jovem candidato a herói de alguma coisa diferente...
Armado apenas com sua inteligência e habilidade de sair no soco, Lampshade... digo, Nightshade parte em sua cruzada para libertar Metro City do medo e do crime, mas... acaba caindo logo de cara em uma cilada do ladino Sutekh (erro de herói novato inexperiente... dê uma desconto para o cara) e deixado amarrado para encarar a morte certa.
A menos que...

Gráficos


Os gráficos de "Nightshade' não são ruins, mas podiam ser melhor acabados e o resultado final é cheio de altos e baixos. As cenas de abertura que mostram o panorama da cidade são legais, mas o Vortex, o heróis que Nightshade tenta se mostrar a altura de substituir, mais parece um Flash desenhado no canto do caderno por um aluno de 5o ano não muito talentoso...
Os sprites dos personagens puxam propositalmente para o caricato, sendo o de Nightshade a maior exceção (aliás, ele é, de fato, o personagem com o visual mais legal do jogo inteiro), mas, como todo o resto, até Nightshade poderia ter sido melhor acabado. 
E o que foi dito dos personagens também vale para os cenários. Tudo é plenamente reconhecível e tudo mais, porém... parecem um tanto crús aos meus olhos. Pelo menos a paleta de cores foi bem acertada nos cenários, ajudando a criar o clima meio lúgubre, meio sujo de megalópole de historieta pulp.
As animações também tem altos e baixos. Os movimentos de Nightshade guardando algo sob o casaco ficaram legais, mas em compensação a animação das estátuas vivas com cabeça de Anúbis saiu sofrível.
Os rostos dos personagens que aparecem durante os diálogos acabaram caricatos além da conta. Os únicos realmente passáveis são o do próprio Nightshade e o do vilão Sutekh- a do vilão talvez até mais interessante que a do herói!
Enfim... os gráficos de "Nightshade" seriam equivalentes a algo como uma história em quadrinhos que foi até bem desenhada, mas o arte-finalista deixou a desejar. 

Música e Efeitos Sonoros


A trilha sonora é acima da média e os efeitos sonoros são O.K. São simples, mas são O.K.
O jogo até tem uma certa variedade de músicas. A que você vai escutar com mais frequência é aquela que toca enquanto Nightshade perambula por Metro City em suas investigações. É bem razoável, com um tom lento e misterioso, enquanto a música dos combates é mais movimentada, por razões óbvias. 
O único senão é que, como "Nightshade" é um jogo que pode demorar, as músicas correm o risco de se tornarem enjoativas com o tempo.

Controles e Jogabilidade

Aqui é outro ponto traiçoeiro... primeiro de tudo, mais uma vez, "Nightshade" te engana a primeira vista... olhando casualmente parece ser um jogo de ação estilo plataforma, meio como o "Darkman" de NES, mas... não é... "Nightshade", mesmo misturando estilos, prioritariamente é um adventure com uma boa dose de "point-&-click". Levando isso em consideração, já dá para entender um pouco o problema dos controles... cada situação tem seu próprio conjunto de controles... a parte de adventure tem os seus, o combate tem outros e por aí vai- e você vai precisar saber cada um deles.
A mistura de estilos em si não é um problema. Na verdade é uma das coisas que deixa o jogo interessante, mas aí também pesou a limitação técnica da época... na hora do combate , por exemplo, para que Nightshade chute é preciso apertar direcional para cima + B, já que o joystick do NES só tinha dois botões de ação.
A hora do combate, aliás, é onde os controles mais deixam a desejar. São um tanto truncados e a resposta também não é perfeita- os chutes, em especial, volta e meia não saem! Dá para contornar isso com treino e pegando a manha de cada inimigo? Sim... dá... mas até isso acontecer, você vai apanhar feito um condenado nos combates.
Nas partes adventure os controles também não são perfeitos. Não são intuitivos e pode levar um tempinho para se pegar o jeito. E a velocidade com que o herói se move não é nada impressionante... talvez Nightshade prefira manter a pose de misterioso ao andar do que se mover mais rapidamente, porém isso com certeza atrapalha um pouco na hora de lidar com algumas armadilhas do cenário, como jatos de vapor quente ou água tóxica.
Tudo isso impede de jogar o título e se divertir? Não... mas é preciso um pouco de paciência para se adaptar aos controles pouco intuitivos e a jogabilidade um tanto truncada.  Fica também a impressão que foi um caso de estúdio pequeno com projeto ambicioso demais e acima dos seus recursos, tendo os controles e a jogabilidade pago a maior parte da conta. 

Dificuldade


Dizer se "Nightshade" é difícil ou não é um tanto complicado... acho que a melhor resposta é dizer que o jogo tem momentos difíceis. Durante a parte adventure, o jogador vai se deparar com vários puzzles e situações problemas durante a investigação. A maioria é fácil, mas alguns são mais critptográficos e precisam de uma boa dose de imaginação. 
Outro aspecto que deixa o jogo mais interessante é que ele não é linear. Você pode perambular pela cidade toda buscando pistas, indo e voltando a qualquer momento; Bastante inovador para o NES, sem dúvida, mas... nem tudo é perfeito... o jogo não possui um mapa da cidade (bem que podia aparecer quando se pausa o jogo, não?) e como as pistas são vagas, deixando o jogo muito em aberto, você pode acabar rodando por tudo que é canto, andando em círculos, até encontrar o rumo certo ou se tocar do que se deve fazer.
As lutas sem dúvida são que deixa o jogo mais difícil. Qualquer inimigo de fase comum é um desafio. Pequeno ou grande, mas um desafio. Para piorar... não existem muitas formas de se recuperar energia... a principal é comprar (e comer) comida, mas existem poucos locais para isso e é sempre bom ficar de olho em quanto se gasta. Mais para a frente no jogo o combatente do crime calouro vai encontrar uma forma mais eficiente de recuperar suas forças, mas é preciso bater um pouco de perna por aí até isso acontecer.
Outro ponto bem criativo de "Nightshade" é a barra de popularidade, que mostra o quanto o justiceiro de sobretudo e chapéu fedora é conhecido e bem'quisto pela população de Metro City. Quanto maior a popularidade, mais informações você consegue ao falar com as pessoas, além de poder ter acesso a uma ou outra coisa não aberta ao grande público, como arquivos de um jornal. Aumenta-se a popularidade vencendo bandidos nas lutas, salvando pessoas e fazendo boas ações- e nenhuma boa ação é pequena demais para um grande herói! Lembre-se disso. E lembre-se também que a popularidade pode cair, se você fizer alguma besteira...
Por último... uma das palavras chaves de "Nightshade" é paciência. Exploração é um dos pontos centrais do jogo. Se você não gosta de gastar muito tempo explorando, prestando atenção em detalhes e fuçando tudo... a coisa vai ficar complicada... "Nightshade" é um título para jogadores que gostam (e bastante) de exploração.

Comentário Final

Como o subtítulo da tela de abertura dá a entender, era para "Nightshade" ter continuação, mas a ideia não foi para frente
"Nightshade" é um jogo criativo, com textos bem escritos e divertidos, cheio de boas ideias e bem diferente da maioria dos jogos de Nintendo da época, mas que não conseguiu alcançar todo o potencial que tinha. Suas limitações pesam e o puxam para baixo, mas ainda assim a balança pende mais para o positivo do que para o negativo no final das contas.  Vale a pena ser jogado nem que apenas por curiosidade.
"Nightshade" é daqueles títulos que você estranha um pouco no início, mas depois acaba gostando. Ainda assim acho que pende mais para o "cult" ou "jogo de nicho" do que para "jogo da massa". Especialmente recomendado para os fãs de adventures e jogadores que amem explorar cenários detalhadamente.

NOTA: 6,0

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